Por: Paulo Eduardo Dubiel
Desequilíbrio é diferente de crise. As mudanças no comportamento do consumidor e nas oscilações de mercado geram desequilíbrio – as coisas mudam de lado –, ficam diferentes do esperado e são interpretadas como crise pela maioria; é quando o cenário perde sua configuração original, tradicional, comum ao dia a dia (o consumidor muda de posição, de comportamento, por exemplo: consome outros tipos de produtos).
Nada permanece o mesmo, a mutação ocorre o tempo todo, em todas as áreas, segmentos e até na vida pessoal. No entanto, a mudança não acontece de uma hora pra outra; tudo é um processo, seja de ascensão ou declínio. Novos conceitos de valores e necessidades surgem da mudança de pensamento e comportamento do consumidor, substituindo ou agregando aos produtos e serviços existentes.
Empresas declinam e outras desaparecem pela falta de visão de marketing e vendas, pelo despreparo dos seus dirigentes, pela ignorância sobre os conceitos intangíveis e sobre os detalhes que abarcam o relacionamento e a relação de consumo.
Muitos criticam o governo e os políticos brasileiros, atribuindo a eles o egoísmo de tomar decisões e ter iniciativas voltadas apenas para seus interesses próprios; porém, muitos empresários e diretores experientes, como gerentes e demais colaboradores também adotam o mesmo princípio; o de levarem as coisas para o lado pessoal.
Entenda que, levar as coisas para o lado pessoal, é um comportamento bastante comum no Brasil; ele distorce e inverte o verdadeiro sentido da relação de consumo – ato ou efeito de consumir, gastar, comprar, uso de produtos e serviços para satisfazer necessidades e desejos.
Quando as coisas são levadas para o lado pessoal, não existe relação, e sim jogo de interesse. Por isso sustentamos a frase que classifica bem o excelente profissional: Profissional é aquele que não leva as coisas para o lado pessoal.
A relação de consumo tem sua base no relacionamento social e na necessidade de troca, com objetivo de favorecer a vida e o bem-estar social; diferente do conceito pessoal de muitos empresários e profissionais que objetivam apenas o lucro, ganhar e ganhar mais ou perder. Ambas as ações parecem iguais, porém a visão pessoal contrária também gera resultados contrários – lucros e ganhos sem sustentação.
Parece, mas não é a mesma coisa, por exemplo: o consumidor precisa do alimento, o fornecedor do dinheiro para manter seu negócio e para outras necessidades, ambos estarão suprindo suas necessidades com a troca. Não há parte mais importante, e sim um ciclo que contempla a qualidade de vida. Nesse cenário, o consumidor detém o poder de escolha, e o fornecedor de ser escolhido ou de gerar circunstâncias que o favoreça. Para que ambos mantenham essa relação, os benefícios e valores deverão estar acima dos interesses pessoais.
O sistema mercadológico e social é natural, individual e coletivo, tem autonomia própria e está constantemente sustentando, produzindo e regulando a si próprio; de forma que mantém a infinita interação com o meio, o qual apenas desencadeia no ser vivo mudanças determinadas em sua própria estrutura, e não por um agente externo.
Muitos tentam mapear e controlar o comportamento do consumidor, como se a base da vida fosse o consumo capitalista e as pessoas estivessem à mercê de ações comerciais; assim como propagandas e publicidades. Esse falso planejador esquece de inserir nos seus estudos, deixando de lado, o sentido real da vida e da existência humana; ignora a simples necessidade de consumir para manter a vida.
Nesse contexto vale ressaltar que o consumo desenfreado é patologia advinda dessa provocação pessoal e egoísta que transforma a relação comercial em ganho pessoal, quando um perde para o outro ganhar. Quando deveria ser prioridade no relacionamento que todos ganhassem da mesma forma.
O mesmo sentido reflete diretamente na relação comercial do empresário, diretor e atendente; quando um precisa do outro e nenhum é melhor do que o outro ou mais importante. Existem exemplos de grandes indústrias que tiveram suas melhores ideias extraídas, não de seus diretores e veteranos, mas de “simples” colaboradores.
As necessidades de consumo são dos consumidores, por isso o profissional que conhece o consumidor e o mercado é superior àquele veterano com experiência limitada nos produtos e serviços que tem. Muitas empresas contratam com base na experiência que o colaborador tem no segmento, porém esquecem que o mais importante é conhecer o consumidor e o cliente.
Como exemplo, a copeira de determinada indústria entende melhor os clientes e conhece as suas personalidades, pois mantém o relacionamento de servir sem esperar nada em troca; já o diretor veterano nunca ouviu um cliente falar de seu produto, a informação que recebe é a que seu gerente defende e quer lhe passar.
O maior erro é acreditar que o veterano de determinado segmento, aquele que recebe o título de experiente, também precisa ser o soberano na decisão; ele tem o hábito de levar as coisas para o lado pessoal e está mais preocupado com seu emprego.
Esse experiente veterano, geralmente, tem medo de perder sua vaga, faz as coisas e cumpre horários com o objetivo de mostrar resultado e fazer jus ao salário que ganha; por terem o controle, manipulam as regras e criticam aqueles que querem inovar. O mercado é formado e movimentado não pelo produto, segmento ou pela expertise de um veterano, mas pelas necessidades e vontades do consumidor.
As empresas até conseguem, com base em estudos, planejar ações de marketing e vendas para atrair compradores e aumentar seu faturamento; porém, dessa forma, estão longe de alcançar o crescimento sustentável como resultado do relacionamento com o consumidor.
A empresa que mantém o relacionamento ativo com o consumidor e o foco em servir e atender as suas necessidades, como também as suas dificuldades; avalia, inova e controla estrategicamente o processo de gestão de marketing e vendas em função da mudança de comportamento, não do seu cliente, mas do cenário que permeia a relação.
Essa visão de mercado funciona com base em características mais específicas, com isso acompanha as mudanças com facilidade, e na pior das hipóteses sua velocidade de adequação é bem maior. Na verdade, com o relacionamento mais próximo, empresa e cliente passam a ser um só contexto; com isso, eles têm autonomia e sustentam, produzem e regulam constantemente a si próprios; mantendo total interação com o meio.
As empresas voltadas para o marketing defendem os interesses dos clientes e consumidores (são verdadeiras advogadas do cliente), pois têm como característica própria o respeito e a valorização do próximo. Sustentam a qualidade total de atendimento, dos seus produtos e serviços, e vivem o processo de melhoria contínua.
O maior objetivo para elas é servir e cumprir com excelência seu papel fundamental na sociedade, construção do bem-estar social e de uma vida melhor. Administram processos financeiros – fluxos de caixa, lucros – com foco no crescimento, na melhoria do seu patrimônio físico e humano; tudo para ser e servir melhor o mercado.
O consumidor percebe essa visão e entende estar sendo respeitado, conclui que a relação interpessoal para a empresa é mais importante do que seu dinheiro, que o sentido de troca é honesto e sente-se bem com isso. O consumidor não só tem suas necessidades atendidas, mas divulga, defende e sustenta esse tipo de empresa para seu próprio bem. É quando a empresa, o negócio e o cliente se resumem numa relação amigável e saudável com o objetivo único de sustentar a vida.
Nesse caso as mudanças são desencadeadas e determinadas em sua própria estrutura, e não por um agente externo. Não há crise, o que há é transformação, adequação! Essas empresas controlam os novos entrantes, estão a frente do mercado e em constante preparação, por isso quase nunca fazem reparos; e quando fazem é com base na realidade e feedback do cliente.
Ao contrário da característica acima, tem empresa que vende e lucra muito, não tem relação com cliente, banco de dados, classificação de público-alvo; apenas atraem consumidores interessados em preços, produtos e serviços. Essas empresas funcionam com base em características mais amplas, ou seja, com base nas tendências de mercado.
O fato é que quando o mercado começa a refletir novas tendências e desequilíbrio, é por que o consumidor já mudou seu comportamento. Geralmente a capacidade de adequação dessas empresas é lenta e seu poder de inovar é quase zero; são empresas que vivem fazendo reparos e reinvestindo seu potencial em função da perda de cliente e da diminuição da receita.
São essas que acreditam na crise e na visão dos seus veteranos; disputam clientes e prostituem a relação de consumo, tornando-a um simples comércio, no qual quem oferece o menor preço vende mais, porém não de forma sustentável.
Tenho presenciado que as empresas que reclamam da crise, se comportam de forma errada e aceitam a crise como desculpa dos seus erros. Como exemplo: a concessionária de carros de marca top internacional, com seu pátio lotado de carros e sua venda baixa; entrei no salão de vendas e todos os vendedores papeando e de braços cruzados, o gerente falando com um amigo ao telefone e o diretor de vendas se engraçando para uma jovem colaboradora bonita; o setor de peças parado e o de serviços com meia dúzia de carros fazendo revisão.
Outro exemplo é uma grande loja de artigos domésticos, os vendedores reclamando que as vendas estão ruins e esperando que entre um cliente na loja, o gerente arrumando produto e o diretor falando que está parado e evitando comprar novidades.
O pequeno pet shop sem site de vendas, sem cadastro de clientes e esperando cair do céu um cliente. A característica mais comum das empresas que reclamam da crise é a do colaborador despreparado, diretor veterano que conhece a fundo o segmento e quase nada do cliente, que permanece esperando para ver o que vai acontecer!
A crise não existe, ou melhor, não existe para todos. Enquanto uns crescem, outros simplesmente desaparecem em menos de três anos de vida, e tem aqueles que permanecem reféns da falta de visão, de informação privilegiada e de relacionamento com seu cliente; tudo por questão de escolha, de como definem seus princípios, missão e visão.
Quando a falta de vendas e desmotivação domina o cenário interno, a culpa dos erros recai sobre a crise e o diretor e gerente veterano permanecem de braços cruzados à espera da crise passar; por acreditarem ou não saberem como agir. É bem mais fácil, para o veterano preocupado com o salário, culpar o mercado pelos problemas recorrentes, do que assumir a própria falta de visão; nesse contexto ele busca outros com a mesma visão para apoiar e se unir à mesma justificativa.
O exemplo clássico do declínio nas vendas – sendo a culpa da crise – são os veteranos diretores de concessionárias, que se revezam nos empregos. Acostumados a vender automóveis como bolas de futebol (do tipo é pegar e levar) e na queda das vendas veiculam comercial de IPI reduzido, ou aquele famoso “jargão” de taxa zero, e tudo volta ao normal. Esses, quando se deparam com uma mudança de mercado ficam obsoletos sem saber o que fazer (se queimar a verba na mídia a empresa afunda e não venderá, se liquidar os carros destrói o posicionamento de preço etc.).
Os profissionais de concessionárias até fingem fazer o pós-venda e manter o relacionamento com o cliente, porém não existe ação inteligente sustentada com o conceito estratégico de servir. Os clientes compram carros e no primeiro mês até recebem uma atenção, no entanto com o tempo o consumidor percebe que é simples formalidade.
Uns até fazem pesquisa de satisfação com o cliente de serviço, porém sem dar feedback. O objetivo se resume nas simples ações de vender carros, peças, acessórios e serviços. Ninguém conhece o cliente, não há relacionamento; apenas relação temporária de venda e o desperdício na manutenção do negócio.
São vários os exemplos errados e negativos, que geram tendências e crise para quem os vivenciam. Por outro lado, temos exemplos positivos e corretos, das empresas que crescem e até nascem na crise dos outros; pelo simples detalhe de não acreditarem em crise, mas sim na capacidade de servir e atender novas oportunidades de mercado e necessidades dos consumidores.
É quando as novas tendências aparecem, juntamente com outro cenário mercadológico. Negócios / Produtos / Serviços são valorizados e desvalorizados apenas por sua aparência, pelo seu atendimento, pela sua localização ou pela visão equivocada e ultrapassada de um experiente empresário, diretor ou gerente que defende (acima de tudo) seus interesses pessoais. Porém, jamais se ouvirá falar em desvalorização, declínio ou crise nas boas relações e relacionamentos comerciais, àqueles que defendem o consumidor e mantêm o cliente ativo e próximo da empresa por vontade própria do cliente. O cenário até oscila, muda, vende-se mais determinado produto e as empresas se fortificam cada vez mais com as diferentes necessidades de seus clientes.
Por Paulo Eduardo Dubiel
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